Hilda Hilst

Hilda Hilst
“Quando você chega a um limite extremo, você procura alguns caminhos de salvação. O alcoolismo é um deles. O outro caminho é a santidade, mas já está tarde demais para se entregar o bagaço a Deus. A santidade é boa quando se começa cedo. É uma nostalgia do homem a santidade, mas é dificílimo. E o outro caminho, impressionante, é o riso.” HH
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    Campinas Jaguariúna

    Lud trem

    Estação Anhumas, Campinas

    Estação Anhumas, Campinas

    trem Campinas

    embarcando trem

    dentro do trem

    Estação de Jaguariúna Estação de Jaguariúna

    Carvalho tri centenário e mesa de pedras onde Hilda se sentava para supervisionar a construção da Casa do Sol

    Carvalho tri centenário e mesa de pedras onde Hilda se sentava para supervisionar a construção da Casa do Sol

    Casa Hilda Carvalho 3

    Casa Hilda carvalho

    Olga Bilenki

    sala Hilda 4

    sala Hilda 3

    sala Hilda 2

    cozinha Hilda

    casa de Hilda 1

    Saida da estacão Campinas
    Um belo passeio dominical para quem quer regatar a emoção de viajar de trem, é embarcar na Estação de Anhumas, em Campinas, rumo à Jaguariúna, de trem. A viagem que acontece as 11 horas dura cerca de uma hora, em vagões com muita animação, incluindo venda de lanches, bebidas, sorvetes, souvenires e música ao vivo. A estação de Jaguariúna é linda. Você encontra bons restaurantes se optar pelo almoço, pois a parada na estação é de cerca de uma hora. Depois, o trem faz a viagem de volta. Aproveitei a viagem para conhecer a Casa do Sol, onde viveu e escreveu a grande poeta Hilda Hilst, hoje transformada em Instituto que leva seu nome. (Hilda será a grande homenageada na FLIP de Paraty neste ano de 2018. Merecidamente.) Uma emoção indizível, esta de caminhar pelos cômodos em que ela viveu, sentar no sofá, admirar as inúmeras obras de arte pelas paredes, ver seus livros, fotos, anotações; passear por sua cozinha, seu jardim e fazer um pedido ao carvalho tri centenário, debaixo da qual a escritora supervisionou a construção da casa, abraçada por tantos escritores, incluindo meu amado Caio Fernando Abreu e fazer um pedido, que contam todos, sempre se realiza. Como fotos falam mais do que palavras, deixo vocês aproveitarem visualmente este passeio.
    Hilda

      

      Infinitos os caminhos para meus passos

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      Infinitos os caminhos
      para meus passos:
      Ruas estreitas, morros, penhascos
      E lá o horizonte inatingível
      a acenar-me da Eternidade.
      Busco as alturas, a alma solta ao vento
      Alma falcão, alma gaivota em voo livre
      Sobre o interminável oceano/tempo.
      Alma desejo de tocar-te , oh mundo!
      Alma antiga a fecundar-te, oh corpo!
      Alma imortal, mas sempre adormecida
      sob a pedra do desejo
      da ilusão da vida.
      (Ludmila, em fevereiro de 2018, com ilustração da Internet)

        

        Quaresma.

        Tibouchina_grandiflora1Na tradição ortodoxa, que eu seguia na minha infância, a quaresma era um teatro, no qual nós, por vezes espectadores, por vezes atores, nos preparávamos para dois atos, sobejamente conhecidos e sempre repetidos e celebrados: O horror da traição e morte de Jesus, e a sua ressurreição, num claro simbolismo de que a morte é feito o casulo do qual a larva se liberta e recomeça a vida como ser alado.
        Os 40 dias que antecediam ao clímax deste drama, celebrado na Semana Santa, nos preparavam, anualmente, para nos interiorizarmos e fazermos um exame de consciência sobre as nossas transgressões, tão humanas e por isso mesmo, tão repetidas. O corpo precisava ficar mais leve. E a alma idem. A carne vermelha era abolida do cardápio. E a branca também, pelos mais radicais. Peixe era permitido, mas apenas às sextas feiras.
        Na quaresma não se ligava a televisão. Quando muito se permitia ouvir música clássica, em especial a obra sinfônica de Rimski-Korsakov “A grande Páscoa russa” que é linda”. Aliás, tem muito tempo que não a ouço…
        Os lampadários de frente aos ícones permaneciam acesos dia e noite, vivificando a mancha amarelada do teto, com sua tênue fuligem, enquanto o avô se entregava à leitura dos evangelistas com a família reunida para ouvir, se emocionar e pedir perdão a Deus, em silêncio, pelos pecados cometidos.
        A cada liturgia dominical, os fiéis também pediam perdão, uns aos outros, por qualquer falta voluntária ou involuntária, antes de receberem a comunhão. E o sacerdote , do púlpito, repetia a máxima do “amai-vos uns aos outros” antes do início dos sermões.
        Depois da Páscoa, a vida seguia seu ritmo natural, mas todos se sentiam melhor para mergulhar na rotina e nas pequenas e grandes transgressões, até a próxima quaresma.
        Cresci e me afastei das celebrações da igreja dos meus, mas as sementes de devoção e sacralidade que aconteceram nos templos de minha infância, seguem para sempre em meu coração. Que meu corpo seja o templo vivo para o espírito que o habita.
        A cada quaresma eu me preparo para me libertar desta casca que me envolve, deste sudário de sangue e ossos para voar, momentaneamente, rumo à Ressurreição, que, quem sabe um dia alcance a mim também, neste palco da vida no qual atuamos, cada qual interpretando o seu papel. Que assim seja e assim se faça. Amém. (Ludmila) imagem Internet

          

          Vaso de lata, flor de jasmin

          PLANTAS EM LATAS 2

          Na minha infância na Aldeia de Carapicuiba, qualquer coisa que se movesse virava distração. Virava brinquedo vivo. Os alevinos do riachinho apanhados na palma das mãos e criados em potes de vidro, eram devolvidos ao seu habitat após algumas semanas ou meses, quando outros eram capturados e a brincadeira prosseguia. Ganhava quem os mantivesse maior tempo vivos.
          As joaninhas faceiras (só valiam as de roupa vermelha) eram capturadas no jardim e plantadas em casa em vasinhos de jasmins e onze horas que cresciam viçosas em latas de Cera Parquetina, Óleo Corcovado abertas na horizontal, Gordura de Coco Carioca ou ainda alguma rara e cobiçada lata de Toddy, saúde e energia, que só os vizinhos mais abastados conseguiam comprar.
          As formigas seguidas por horas pelas trilhas do quintal e ampliadas pelas lentes de aumento do avô, constituíram as minhas primeiras experiências com microscópio, desvendando seus corpos articulados e ferrões que às vezes me feriam.
          Até as dálias plantadas nos canteiros se moviam. Eu as retirava periodicamente da terra fofa para observar a alongamento de raízes e as minhocas nervosas se contorcendo sob a luz do sol.
          Os besouros unicórnios eram uma distração à parte. Capturados ao entardecer eram transformados em insetos de carga quando recebiam as caixinhas vazias de fósforos atadas com linhas finas de costura às reentrâncias de seus corpos alados. A brincadeira durava até que eles, cansados, abrissem suas pequenas asas e escapassem do trabalho escravo.
          As galinhas poedeiras, presentes em todos os quintais nos encantavam com as descobertas de anatomia. Como por milagre, os ovos galados criavam os embriões, que podiam ser admirados contra a luz do sol, e, semanas depois surgiam os pintinhos, alegria de toda a criançada.
          Ah! E havia também os cães e gatos. Nunca se via os bichos abandonados pelas ruas, esqueléticos, feridos e famintos. Logo eram adotados e se transformavam em membros da família. Pulguentos, alguns, é certo, mas felizes da mesma forma. As cadelas prenhas tinham os filhotes adotados já durante a gravidez e distribuídos pela vizinhança após o desmame. Raros os de raça pura. A maioria mais querida eram todos vira latas que corriam atrás dos gatos pela vila afora. Pela vida afora.
          Assim cresci, numa pobreza franciscana de imigrantes recém chegados ao Brasil, mas minha infância foi um território riquíssimo de alegria e divertimento. E assim foi esse tempo retido na memória. (Ludmila)
          Em Cem crônicas escolhidas e alguns contos clandestinos a ser lançado em breve.
          Foto Internet

              

            Submerged Time

            SOLOVKI

            “I walk by the majestic cathedral built of rough stone and my soul cannot give up. Where is the salvation? Where is the time to retreat, to destroy that moment of admitted madness, feelings of numbness? Where to desperately seek for a love equal to infinity, or simply sharing the calm sunshine, the warmth of the fire, the blessing of the bread and water? From distance, the water of the Saint Lagoon is a deep cobalt blue, and it calls me, and tempts me … Come!

            Then I allow myself to slide to the bottom of it, to that ancestral deepness where the night viscously prowls me, where dragons and serpents haunt me, where there are mistletoe and a deep pain that prevents me from breathing. There are so many moans. So much regret. And bones that disintegrate, and fibers that dissolve, and dull days, dull as the words that accumulate and decompose. I walk, little by little, on its muddy bottom: Persephone descending into hell to be reborn, but only death surrounds me and touches me with its icy fingers of algae. I cross nebulous spaces, where the spirals of time no longer leave their impression. Faces only, just faces intertwine in front of me. Faces which already are only memories. An irregular memory guarding within itself an accumulated time, not lived to its fullest, not exhausted, and before, aborted. A space for escape opens over my eyes: a chink of sky behind the clouds, and the sound of the bells. I let it lead me. The sound grows, grows and involves me; I walk back down the dirt street and I see two children holding hands. I approach them, and before they ask for bread, I kneel, and I involve them with my love, and only then I can absolve myself.”(Excerpt from the book of Ludmila Submerged Time)