Liturgia da Consagração

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Gesto-te, sangue de meu sangue, meu poema
e teu canto me alcança quando o meu se cala.
É para dizer-te que eu existo.
És a raiz de todas as palavras que me faltam.
Eu te nomeio, apenas, para que me fecundes com o fogo de teu verbo.
Ele que consagra a noite com o mesmo dom velado com que sangra o dia.
Toco tuas palavras que me inspiram
e se transformam em pão em minha boca
e então…
Sento-me à mesa e te comungo
nessa liturgia da consagração
em que o poema se faz carne e me habita.
(Ludmila)

    

    Fala

    palavra

    Tudo
    será difícil de dizer:
    a palavra real
    nunca é suave.

    Tudo será duro:
    luz impiedosa
    excessiva vivência
    consciência demais do ser.

    Tudo será
    capaz de ferir. Será
    agressivamente real.
    Tão real que nos despedaça.

    Não há piedade nos signos
    e nem o amor: o ser
    é excessivamente lúcido
    e a palavra é densa e nos fere.

    (Toda palavra é crueldade.)

    Orides Fontela

       

      Exercício para treinar ausências

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      Exercício para treinar ausências

      Adentrar o esquecimento
      e caminhar por suas ruas nuas
      Sem tempo nem roteiros.
      Adentrar o esquecimento
      e, sem lágrimas, celebrar
      o vácuo de memórias.
      As pedras sobre os olhos
      O silêncio sobre os lábios.
      Adentrar o esquecimento
      e, no limbo, anelar um verbo
      virgem de sentido e ver cada coisa
      renascer com novo nome e espírito
      E, novamente, das trevas ver surgir a luz!
      (Ludmila)

        

        Os sinais se fixam nas dobras da memória

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        Os sinais se fixam nas dobras da memória

        Os sinais se fixam
        nas dobras da memória
        e a dor desperta o esquecimento:
        raiz de tantos segredos que o tempo encobre.
        Silêncio…silêncio…
        Dormem as estrelas envoltas por uma luz
        que há muito já não brilha.
        A noite é um vagão povoado de espectros.
        Eles, com gestos leves
        desenham sinais, indecifráveis,
        que se fixam nas dobras da memória
        e esta dor…
        (Ludmila Saharovsky)

          

          Abismo de Rosas

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          Abismo de rosas (com licença poética de Americo Jacomino – Canhoto)

          Grito teu nome
          Sobre o abismo
          e a paisagem renasce entre os rochedos.
          Teu nome feito de barro e sementes,
          vento e luz, é água viva, fonte de murmúrios.
          Teu nome reverbera, arde em mim:
          carne, sangue, seiva, raiz e fruto.
          Teu nome – canto de amor
          neste abismo de rosas.
          (Ludmila Saharovsky)

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          Américo Jacomino (São Paulo 12 de fevereiro de 1889 — 7 de setembro de 1928) foi um importante compositor e violonista brasileiro, popularmente conhecido por Canhoto, em virtude de executar o dedilhado no instrumento com a mão esquerda, sem inversão do encordoamento. Canhoto foi um dos responsáveis por transformar o violão num instrumento musical “nobre”, uma vez que, até então, apenas boêmios faziam uso dele.

             

            Wilson Caritta

            pintura do artista russo Vladimir Kush, considerado o Salvador Dali da Russia

            pintura do artista russo Vladimir Kush, considerado o Salvador Dali da Russia


            Nunca mais a vi, mudou-se para as páginas de um livro.
            Junto ao poema, ela fica sentada nas linhas do que havia escrito,
            em segredo, abraça todos os sentidos de um amor perdido.

            Ao abrir o livro,
            um leitor descuidado em desaviso,
            encontra aquele amor distraído,
            e não pula para a página seguinte.

            Ela está esperando por todos os cantos da palavra
            que alguém a resgate e devolva toda a sua história.

            Recapitulei as páginas, carreguei as palavras e levei tudo pra casa,
            (não há mais lágrimas para aprender), todos os livros vivos,
            soltam um pouco de gente nas suas folhas.

            Wilson Caritta.
            o poeta nasceu em São Paulo em 1964. É autor de Rebeldes Olhos azuis (1988)
            O profeta da Ilha (2002) e Poemas em Autoplágio (2013)