Sempre se pode cantar

“Continuo a pensar que quando tudo parece sem saída, sempre se pode cantar. Por essa razão escrevo.”
(Caio Fernando Abreu)

“Por essa razão escrevo”…. eu também. Quando me alcança essa vontade, esteja eu observando Shiva, minha cadela negra, Labradora, que me abana o rabo tantas vezes quantas seus olhos me encontram, esteja eu vendo minha neta cobrindo o menino Jesus esculpido pela Carolina Migoto, deitado sobre o vidro de minha mesa da sala (“está frio, vovó!”) ou simplesmente descascando batatas para o almoço…necessidade alguma se torna mais premente. É feito uma compulsão! Não…melhor dizer: É feito um vício, pois fico aflita, inquieta, irritada quando não posso exercitá-lo. Escrevo em agendas, em folhas soltas, em mil cadernetinhas, no teclado do computador. Faço anotações em páginas de livros (livro sem nossos grifos particulares é tão impessoal, não acham?) em diários que mantenho ao lado da cama, para relatar meus sonhos (se não documentá-los assim que acordo, depois os esqueço…e esquecendo, como saber o que meu inconsciente queria dizer-me?) bem como alguma idéia repentina que brota ali, na horta dos pensamentos e, se não for logo recolhida, ah!…vem um pardalzinho sem assunto e a carrega para o nunca mais! Adoro escrever em resposta a tantas cartas, aquelas tradicionais, que ainda (pasmem!) continuo recebendo pelo correio, com selos e carimbo. Aliás, tenho me correspondido há anos, com amigos próximos e distantes, porque, por um destes mistérios indecifráveis, conseguimos dialogar mais por escrito, do que pessoalmente (Dailor que o diga!) Depois, reler estes manuscritos faz tão bem à alma! Alguns amigos já nem estão mais de corpo presente em minha vida: Guima Pan, Fernando Fagundes, Justino, Enio Puccini, Raul Floriano, Aluisio do Amaral Campos, Ivan Saharov, Maria Beshkur…(Ah… bateu uma saudade danada de cada um deles!) mas sua letra, suas mensagens carinhosas impressas no papel, elas como que testemunham e materializam o tempo que se viveu junto, os momentos em que se celebrou a amizade, em que se foi cúmplice na troca de informações, e quiçá, também de alguns segredos…) Eu necessito de escrever, até para, no decorrer da vida, tornar-me, eu creio, uma pessoa melhor e certamente mais tolerada pelos meus. Para tanto, criei algumas técnicas que sempre aplico. Uma delas, consiste em rascunhar longas missivas para pessoas que, no decorrer da vida vão me magoando…muitas vezes até sem o saber! Pessoas com quem é complicado demais voltar a tocar em temas que ficam ali, à volta de nossa cabeça, feito nuvens carregadas de chuva, relâmpagos e trovões, e que para elas, muitas vezes, já passaram! Bom: Eu me sento e escrevo exatamente tudo que me vem à mente: Argumento, peço e dou explicações, exponho meu âmago, sou chata e muito malcriada. Depois, necessidade acalmada, coração aliviado e mente quieta, rasgo tudo o que escrevi. Pico bem picadinho e jogo no lixo. Então…. Milagre! O ressentimento se esvai, junto! Experimentem! É um excelente exercício para se terminar o dia de alma bem lavada e o coração leve, livre e solto! E então…cantem!
(Ludmila Saharovsky)

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